O cenário de opressão e violências contra os direitos humanos que vigora nos ditos países islâmicos é fruto de uma interpretação tradicionalista-ortodoxa que baseada em determinada exegese do Corão prima por um Islã totalizante e totalitário. Tal identidade, aludida como a única genuína, subscreve-se com a decretação da Shari’a, no seu viés mais sectário, e pretende realizar-se no ideal do Estado Islâmico. No entanto, essa vertente não encontra unânime respaldo no mundo muçulmano, e pululam reivindicações em contrário, em prol da aproximação entre esta religião-cultura e os referidos paradigmas jus-humanitários. Nesse passo, temos que o Corão, a fonte primordial do Islã, ao lado da diretriz arbitrária e repressora, também enaltece os princípios da paz, da tolerância e da liberdade. Intrínseco e paralelamente a isso, esse mesmo texto legitima a Torá e o Evangelho como verdadeiras revelações divinas, indicando uma identidade ética entre o Islã e a tradição judaico-cristã. Portanto, com base no processo sócio-histórico de juridicização das regras e princípios culturais prévios que fundamentaram a concepção contemporânea dos direitos humanos – processo pelo qual discorremos - e a par dos primados éticos emanados pelos aludidos livros bíblicos, auferidos de uma breve digressão em seus textos, e, ainda, respaldados pelo arcabouço epistemológico da teoria da interculturalidade dos direitos humanos, com fulcro na “crítica interna”, tentamos respaldar uma reaproximação entre o Islã e os relatados paradigmas humanitários, fundamentados no próprio texto sagrado islâmico. Em vista disso, e para tanto, partimos da investigação do conflito de diretrizes axiológico-normativas emanadas das suras do próprio Corão, consubstanciadas na dicotomia pré e pós conflito de Medina, para perscrutarmos e pormos “a descoberto” os enunciados e preceitos que admoestam à paz, à tolerância e ao respeito às liberdades de crença, de pensamento e de expressão, além de outras, civis e políticas, em busca de salvaguardarmos a dignidade humana e os direitos dos cidadãos destes países, sem discriminações de gênero, de etnia, orientação sexual, ideologia política e religião.